As conversas sobre neurodivergências e relacionamentos românticos ainda são cercadas de muitos estigmas. Além das atipicidades que atravessam as relações entre pessoas neurodivergentes, existe também uma invalidação do diagnóstico por parte dos próprios profissionais de saúde que minimizam os desafios de interação que surgem no dia-a-dia das pessoas autistas pelo simples fato de serem casadas, constituírem família ou conseguirem se manter em um emprego de maneira estável.
Pessoas autistas se relacionam amorosamente e é comum que seu relacionamento afetivo seja atravessado por particularidades e preferências, que normalmente não acontecem nos relacionamentos entre pessoas neurotipicas, são alguns exemplos:
- A sensitividade sensorial, que pode implicar na demonstração afetiva pelo toque e na relação sexual.
- A rigidez cognitiva, que pode levar a dificuldade para encontrar diferentes soluções para um problema enfrentado na relação.
- As dificuldades na comunicação e interação social, que podem comprometer a relação quando o parceiro evita participar de eventos sociais ou se sente sobrecarregado quando o faz por um longo período de tempo.
- As dificuldades de autorregulação emocional e do comportamento, impulsividade, desorganização em pessoas com TDAH.
- O hiperfoco em pessoas, quando há um interesse intenso, podendo se envolver profundamente, buscar saber tudo sobre o parceiro.
- O hiperfoco em determinados temas, que pode restringir os interesses e limitar as conversas entre o casal; dentre outros.
Esses são alguns pontos que podem atravessar o relacionamentos com ou entre pessoas neuroatipicas. Mas, o ponto central desse texto, e que eu gostaria de destacar, é que construir e fazer a manutenção do vínculo não é responsabilidade apenas de uma das partes da relação. É necessário haver compreensão e empatia entre todas as partes envolvidas. A escuta e o diálogo – leia-se comunicação – são essenciais para cultivar afetos, comunicar limites, antecipar ausências, alinhar expectativas e exercer a empatia.
Devido aos problemas de promoção da inclusão e acessibilidade nos espaços, estatisticamente, pessoas neuroatípicas apresentam menor engajamento social. Ou seja, enfrentam desafios para se manter nas escolas, universidades, empregos e outros círculos. E, aliadas às atipicidades na comunicação e interação social, essas questões reduzem suas oportunidades para se entrosar com possíveis parceiros e construir relacionamentos românticos.
Sendo assim, existem alguns caminhos para construir relações mais leves e saudáveis. Antes de tudo, é necessário entender que o vínculo não é responsabilidade apenas da pessoa neurodivergente. É importante aprender sobre si, mas também é fundamental respeitar a individualidade do parceiro. Tentar antecipar ou pressupor intenções ou entender determinados comportamentos como decisões pessoais só gera ressentimento e frustração. Por isso, é válido fazer o esforço conjunto em aprender que existem formas específicas de comunicação a fim de sanar essas faltas, evitar distorções e criar laços seguros.
Uma boa conversa, às vezes o respeito à necessidade de silêncio do parceiro, não invalidar o que o outro diz, sente ou como se afeta com determinadas falas ou estímulos são maneiras de se mostrar interessado em compreender o universo do outro. Estas são algumas medidas que podem ajudar a entender como o parceiro funciona, a identificar padrões e pensar em saídas empáticas e estratégias criativas para lidar com as particularidades. E também é uma forma de criar intimidade e conexão, é claro.